Tema 1.348 do STF e o ITBI na integralização de capital: o que empresários e holdings imobiliárias precisam saber agora.

Tema 1.348 do STF e o ITBI na integralização de capital: o que empresários e holdings imobiliárias precisam saber agora.

Tema 1.348 do STF: imunidade do ITBI alcança integralização de imóveis em sociedades com atividade imobiliária?

O Supremo Tribunal Federal (STF) julga, no Tema 1.348, se a imunidade do ITBI (imposto municipal sobre transmissão de bens imóveis) alcança a integralização de capital social com imóveis quando a sociedade tem receita/atividade preponderantemente imobiliária.

O voto do relator, Min. Edson Fachin, já foi publicado e sinaliza que a imunidade é incondicionada nessa hipótese, isto é, independe de a empresa atuar predominantemente no setor imobiliário, até o limite do capital a integralizar. O processo ainda aguarda os votos dos demais ministros, mas o voto do relator é um forte indicativo do caminho que o STF pode consolidar e, desde já, abre oportunidades de recuperação de ITBI pago nos últimos anos e de melhora do ambiente de negócios para o setor imobiliário e para holdings familiares.

  1. O que está em jogo

Quando um sócio aporta um imóvel para integralizar capital (aumentar ou formar o capital social da empresa), muitos municípios cobram ITBI. A Constituição, porém, prevê imunidade em duas hipóteses: (i) realização de capital (a situação acima); e (ii) reorganizações societárias (fusão, incorporação, cisão, extinção). A dúvida recorrente sempre foi: se a empresa tem atividade/receita preponderantemente imobiliária, há perda da imunidade também na integralização de capital? O voto do relator responde não: a restrição aplica-se apenas ao segundo grupo (reorganizações), não à integralização de capital.

Ponto-chave do voto do relator: a expressão “salvo se, nesses casos”, no art. 156, §2º, I, da CF, restringe a exceção somente às transmissões decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção, não às transmissões para realização de capital. Logo, a imunidade na integralização é incondicionada (independe da atividade preponderante).

  1. O que disse o relator (e por que isso importa)

2.1. Imunidade incondicionada na integralização (até o limite do capital)
O voto alinha-se à tese firmada no Tema 796: a imunidade cobre a integralização de capital com imóveis até o valor do capital subscrito a integralizar; eventual excedente (valor do imóvel acima do capital a integralizar) pode ser tributado pelo ITBI. A inovação aqui é reforçar que essa imunidade não depende do objeto social da empresa.

2.2. A “chave” gramatical do texto constitucional
O relator decompõe o art. 156, §2º, I, em duas partes (realização de capital e reorganizações), destacando que o advérbio “nesses casos” limita a ressalva às reorganizações — e não contamina a integralização. Trata-se de leitura histórica e gramatical da evolução constitucional e do emprego preciso das expressões “salvo se” e “nesses casos”.

2.3. Finalidade (teleologia) da imunidade
A imunidade visa incentivar a capitalização das empresas, facilitar o trânsito de imóveis do patrimônio do sócio para o da pessoa jurídica e estimular o desenvolvimento econômico. Criar barreiras fiscais nesse momento frustra a finalidade constitucional.

2.4. Relação com o CTN
O voto registra que, no ponto relativo à condicionante por atividade imobiliária para integralização de capital, os arts. 36 e 37 do CTN não foram recepcionados pela CF/88, prevalecendo a leitura constitucional da imunidade incondicionada para a integralização.

2.5. Proposta de tese
Texto proposto pelo relator: a imunidade do ITBI na realização de capital (mediante integralização de bens/valores) é incondicionada, indiferente à atividade preponderantemente imobiliária — observado o limite do capital a integralizar (como já decidido no Tema 796).

Importante: O julgamento ainda não terminou. O entendimento pode ser confirmado, ajustado ou rejeitado pelos demais ministros. Ainda assim, o voto do relator constitui sinal relevante e fundamentado para orientar decisões estratégicas desde já.

  1. O que muda na prática (se o STF consolidar a tese)

Integralização de capital com imóveis: sem ITBI, independentemente de a empresa ter receita majoritariamente imobiliária, até o limite do capital a integralizar. Acima desse limite, o excedente pode ser tributado.
Reorganizações societárias (fusão, incorporação, cisão, extinção): aqui permanece a ressalva da atividade preponderantemente imobiliária; ou seja, nesses casos, a imunidade pode não se aplicar se a atividade do adquirente for compra e venda, locação de imóveis ou arrendamento mercantil.

Exemplo numérico (simplificado):
Capital a integralizar: R$ 7 milhões.
Imóvel aportado: R$ 10 milhões.
Imunidade cobre R$ 7 milhões (integralização do capital).
Excedente: R$ 3 milhões, sobre o qual o município pode cobrar ITBI.

  1. Oportunidade de ressarcimento: é possível reaver ITBI pago?

Para operações de integralização de capital com imóveis em que o município exigiu ITBI (sob a justificativa de que a empresa possuía atividade/receita imobiliária preponderante), o entendimento do relator abre espaço para repetição do indébito (restituição do que foi pago indevidamente). Em regra, vigora o prazo prescricional de 5 anos a partir do pagamento para pleitear a devolução (via administrativa ou judicial), sujeito às particularidades de cada caso e de cada município.

Checklist inicial de documentos:

  1. Contrato/estatuto social e atos de aumento do capital (deliberação societária).
  2. Laudos/avaliações do imóvel aportado (para comprovar o limite do capital).
  3. Guia(s) e comprovantes de recolhimento do ITBI e respectivas declarações municipais.
  4. Matrícula do imóvel e escritura/instrumento do aporte.
  5. Comprovantes contábeis (lançamento do capital integralizado).

Estratégias possíveis:

  1. Auditoria de ITBI dos últimos 5 anos para mapear aportes de imóveis tratados como tributáveis.
  2. Pedidos administrativos de restituição (quando a prefeitura admitir), com fundamentação no voto do relator e precedentes alinhados.
  3. Ação judicial de repetição do indébito quando o caminho administrativo for inviável ou insuficiente.
  4. Gestão de riscos: avaliar impactos em transações subsequentes, responsabilidades de cartórios e eventuais autuações já lavradas.

Atenção: embora o voto do relator seja robusto e esteja alinhado à lógica do Tema 796 (imunidade até o limite do capital), o julgamento não foi concluído. Recomenda-se estruturar a estratégia com análise caso a caso e avaliar timing (administrativo x judicial) conforme o perfil de risco da empresa.

  1. Melhoria do ambiente de negócios imobiliários e de holdings familiares

Para incorporadoras, SPEs e gestoras de ativos imobiliários:

  • Redução de custo de capital: aportes de imóveis para capitalizar veículos de projeto tendem a ficar desonerados (até o limite do capital), permitindo estruturas mais eficientes.
  • Segurança jurídica nas operações de seed capital com ativos imobiliários: maior previsibilidade sobre fluxo de caixa e alocação fiscal.

Para holdings patrimoniais e familiares:

  • Organização patrimonial via integralização de imóveis no capital da holding com menor atrito tributário (até o limite do capital), favorecendo planejamento sucessório e governança.
  • Cuidado com reorganizações: fusões, cisões e incorporações continuam sujeitas à condição da atividade preponderante. Na prática, integralizações ganham protagonismo como primeiro passo de reorganizações mais amplas, sempre com desenho jurídico-contábil adequado.
  1. Roteiro de ação (passo a passo)

  1. Mapeamento
    Levante todas as operações de integralização de capital com imóveis (últimos 5 anos) e respectivos pagamentos de ITBI.

  2. Enquadramento jurídico
    Classifique as operações: integralizações x reorganizações. Priorize as integralizações com ITBI pago por causa da atividade imobiliária preponderante.

  3. Cálculo do potencial de recuperação
    Para cada operação, compare: valor do imóvel × limite do capital integralizado; projete valor passível de restituição (atenção ao excedente).

  4. Provas e narrativa técnica
    Organize documentos (atos societários, laudos, guias, escrituras, contabilidade) e fundamente com os pontos do voto: (i) imunidade incondicionada na integralização; (ii) limite do capital; (iii) finalidade constitucional; (iv) não recepção dos arts. 36 e 37 do CTN no ponto.

  5. Escolha da via:

  • Administrativa: quando o município demonstrar abertura.
  • Judicial: para travar tese e suspender exigências futuras, se necessário.
  1. Governança e futuro

Ajuste políticas internas para sempre formalizar integralizações com lastro documental e avaliações.
Recalibre modelos societários: integralização como via preferencial de entrada de ativos imobiliários em SPEs/holdings; reorganizações somente quando indispensáveis (e com análise da atividade preponderante).

  1. Perguntas frequentes (FAQ)

1) Isso já está valendo?
O voto do relator é público e robusto, mas o julgamento ainda não terminou. Ele é um bom indício e já pode embasar pedidos administrativos e ações judiciais, com adequada avaliação de riscos.

2) Vale para empresa com 100% da receita imobiliária?
Sim, na integralização de capital: a leitura defendida é que a imunidade não depende da atividade preponderante (até o limite do capital). Excedentes ainda podem ser tributados.

3) E em fusões, cisões e incorporações?
A exceção por atividade preponderante permanece “nesses casos” (reorganizações). A atenção deve ser redobrada.

4) Como ficam os cartórios e a escritura?
A operacionalização exige documentação robusta (atos societários, avaliações, comprovação do capital a integralizar). Isso facilita registro e minimiza exigências.

5) Qual o prazo para pedir restituição do ITBI?
Em regra, 5 anos contados do pagamento. Recomenda-se auditoria imediata para não perder oportunidades por prescrição.

     8. Conclusão

O voto do relator no Tema 1.348 reposiciona a integralização de capital com imóveis no centro de uma agenda de eficiência fiscal e de capitalização de empresas do setor imobiliário e de holdings familiares. A imunidade incondicionada na integralização (até o limite do capital) — independente da atividade preponderantemente imobiliária — é coerente com a finalidade constitucional de facilitar a formação de capital, estimular o empreendedorismo e destravar o mercado. Embora o julgamento ainda esteja em andamento, o voto oferece lastro jurídico suficiente para mapear créditos, planejar restituições e recalibrar estruturas societárias com maior segurança.

Como podemos ajudar: nosso escritório tem equipe dedicada para (i) auditoria de ITBI, (ii) quantificação de créditos para repetição do indébito, (iii) desenho de estruturas para SPEs, incorporadoras e holdings familiares, e (iv) contencioso estratégico para assegurar o melhor desfecho em cada município.

 

Voto do relator, Min. Edson Fachin, no RE 1.495.108/SP, disponível em: https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=6929423&numeroProcesso=1495108&classeProcesso=RE&numeroTema=1348

Sobre o Autor

  • Pós-graduado em Direito Empresarial pela FGV/SP. Fundador do escritório e sócio responsável pelas áreas de Direito Empresarial, Conflitos Societários e Estruturação de Empresas Familiares.

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